Reabilitação de Linfedemas

Sandra Miguel
Médica

Consultora de Fisiatria
“Há muitos anos que não calço botas… e fiquei muito contente por voltar a calçá-las depois do tratamento!” (citação de doente de 42 anos)

Deixei de sair com os meus amigos, porque tinha vergonha da minha perna e de ter de andar sempre de calças de fato de treino” (citação de doente de 24 anos);

“Não visto calças de ganga já há muitos anos… e voltei a vesti-las recentemente depois da fisioterapia” (citação de doente de 24 anos)

“Uma vez, no aeroporto, ao olharem para a minha perna, obrigaram-me a despir as calças para comprovarem que não levava nenhum objecto dentro das mesmas” (citação de doente de 47 anos)

“Desde que tenho linfedema deixei as danças de salão e não tinha esperança de voltar a dançar…, mas consegui voltar a dançar depois da reabilitação …” (citação de doente de 60 anos).

Estas são algumas das frases ouvidas na minha consulta de reabilitação de
linfedemas e que me permitem dizer ao doente: “a sua doença, apesar de à luz do conhecimento actual, não ter cura, tem tratamento”.

Os linfedemas são uma das patologias em que a intervenção multidisciplinar (cirurgião vascular, médico fisiatra, fisioterapeuta, enfermeiro, nutricionista, psicólogo, assistente social) e diferenciada específica é essencial para que o doente possa voltar a ter uma vida com qualidade. Nesta equipa, todos são chamados a participar com o seu saber específico e a participar em áreas comuns, como a educação para a saúde e a autonomização dos doentes.

O objectivo do tratamento de reabilitação é a redução do edema e a manutenção da integridade das estruturas de suporte. A equipa de reabilitação trabalha com o doente e com a sua família no sentido de se estabelecerem objectivos realistas. Estes objectivos são estabelecidos a curto e a longo prazo e são reavaliados periodicamente. Tratando-se de uma doença crónica, deve ser sempre transmitida uma esperança realista ao doente e à sua família.
A abordagem terapêutica mais efectiva e amplamente aceite é uma terapia combinada, que compreende:

  1. A educação do doente e família no que respeita aos cuidados com a pele e faneras (unhas), para minimizar o risco de complicações infeciosas e de agravamento do linfedema:
    - Higienização regular e adequada da zona afectada, pelo menos duas vezes ao dia;
    - Hidratação regular da pele, também duas vezes ao dia;
    - Evitar  feridas  e  picadas (de agulhas ou insectos) no membro afectado, nomeadamente injecções e tirar sangue; devem usar-se luvas na cozinha e na jardinagem;
    -  Evitar pressões excessivas no membro afectado – roupas apertadas, calçado apertado, medir a tensão arterial;
    - Evitar a exposição solar directa – o calor contribui para a exacerbação do edema; pode ir à praia nos horários recomendados (antes das 10h e depois das 17.30h);
    - Tratamento de lesões fúngicas das unhas e pele – o doente deve ser orientado para Consulta de Dermatologia, porque quanto maior o tempo de evolução das mesmas, maior será a dificuldade em tratá-las. Estas lesões representam portas de entrada para infecções;
    - Estar atento ao aparecimento de processos inflamatórios locais (dor, calor, rubor, aumento do edema) e entrar rapidamente em contacto com o médico assistente para orientação célere;
    - Não interromper terapêuticas profilácticas (penicilina mensal) sem ordem médica expressa.
  2. Orientação para consulta de nutrição onde lhes será prescrita uma dieta adequada em proteínas e nos indivíduos com excesso de peso ou obesidade, estimulá-los a mudarem hábitos alimentares com vista à perda de peso;
  3. Orientação para consulta de psicologia, em casos selecionados em que se percepciona ansiedade, depressão, isolamento social;
  4. Estimular o indivíduo para a prática regular de exercício físico, de baixo impacto e adequado à tolerância do doente (exercícios de treino aeróbio, nomeadamente caminhadas, passadeira…); apesar de ser muitas vezes desvalorizado, é um componente importante do tratamento na medida em que contribui para a reabsorção das proteínas e promove o fluxo linfático, além de melhorar a condição cardio-vascular, respiratória e psicológica;
  5. Drenagem linfática terapêutica: idealmente, as sessões efectuadas por fisioterapeuta com formação específica, serão diárias, com os objectivos de redução da perimetria (mede-se com regularidade o perímetro do membro, em localizações específicas para comparação posterior e efectua-se registo fotográfico). Trata-se de uma modalidade de massagem especializada que compreende movimentos lentos e rítmicos e que respeita a fisiologia da circulação linfática. Actua mediante a estimulação da remoção de líquido linfático pelos vasos linfáticos superficiais ao estimular a contractilidade intrínseca destes vasos. Em regra, uma massagem tecnicamente correcta, produz resultados em 8-12 sessões. Esta técnica revela-se muito eficaz na chamada fase de tratamento (fase durante a qual se reduz o edema até se atingir uma perimetria que se mantém estável).
  6. Pressões sequenciais intermitentes (ou pressoterapia, popularmente designadas “botas ou mangas”): consiste num sistema de ar comprimido, que utiliza pressões variáveis, com várias câmaras pneumáticas dispostas ao longo do membro e que são activadas sequencialmente contribuindo para a redução do componente líquido do edema. As pressões recomendadas são baixas (20-30mmHg) respeitando a fisiologia da circulação linfática e efectuam-se durante cerca de 30 minutos. Há doentes, na fase de manutenção (fase em que já se atingiu a estabilização do edema), aos quais aconselhamos a aquisição do aparelho de pressões para poderem efectuar o tratamento no domicílio, com regularidade e conforto. Reforço a importância do doente se aconselhar com o médico fisiatra e com o fisioterapeuta relativamente ao aparelho mais adequado porque existem muitos no mercado que não produzem os resultados desejados, devido às suas especificações técnicas.
  7. Bandas multicamadas: consiste na aplicação de ligaduras de baixa elasticidade, em camadas sobrepostas sobre uma interface de protecção da pele. São aplicadas pelo fisioterapeuta após a realização da pressoterapia e da massagem de drenagem e o doente vai para o domicílio com as bandas. Contribui significativamente para a redução da perimetria, pelo que são usadas na fase de tratamento, mas também na fase de manutenção. Em casos selecionados, o doente e família podem adquirir o kit de bandas nas casas ortopédicas e aprender com o fisioterapeuta a aplicar as mesmas e os cuidados a observar durante o seu uso. A  aprendizagem da auto-bandagem tem-se revelado muito importante, na manutenção de bons resultados, nos nossos doentes e na autonomia do doente em gerir a sua doença crónica, nomeadamente nos doentes que residem longe do Serviço de Medicina Física e de Reabilitação;
  8. Material de contenção elástico (meias / mangas): devem ser prescritas e adquiridos após a estabilização da perimetria e idealmente confecionadas em malha plana. Este tipo de material é caro, mas fundamental para a manutenção de resultados. Para os doentes que não tenham recursos para a sua aquisição, o médico fisiatra pode prescrever este tipo de produto através da “plataforma de ajudas técnicas” disponível nos hospitais e também disponível nos centros de emprego, o doente recebe o produto sem encargos. Infelizmente, verificamos nos últimos anos um enorme desfasamento entre a data da prescrição destes produtos e a data da recepção dos mesmos pelos doentes. Também temos casos de doentes sem recursos económicos, em que a aquisição do material de contenção foi efectuado através da Liga dos Amigos do Hospital. 
Do que foi exposto, reforço que para o tratamento dos doentes com linfedema, não basta efectuar fisioterapia e deixar nas mãos dos técnicos, a saúde de cada um: é preciso mudar comportamentos! Se o doente mantém uma dieta inadequada, uma vida sedentária, reduzidos cuidados higiénicos, não usa o material de contenção prescrito, o contributo da fisioterapia, per si, é transitório.

O início do tratamento do linfedema e a orientação para reabilitação deve fazer-se precocemente. Quanto mais cedo o doente for avaliado pela equipa de reabilitação maiores são as probabilidades de se conseguir reduzir e estabilizar o linfedema e de se evitar as suas complicações. Os doentes orientados para reabilitação de linfedemas, não só melhoram a sua saúde física, como também a psicológica. Os problemas de ansiedade e de depressão surgem frequentemente no contexto de doenças crónicas, particularmente quando os doentes não têm as ferramentas que lhes permitam sentir que controlam a situação. Quanto mais esclarecido for o doente relativamente à sua doença maior será a probabilidade de se atingirem resultados favoráveis. A reabilitação de linfedemas, promovendo a educação terapêutica do doente e dos seus familiares mais próximos, minimiza o impacto físico e psicológico da doença crónica.

Sandra Miguel
Médica
Consultora de  Fisiatria

Caminhada Nórdica|Nordic Walking no dia do Linfedema

A ANDLinfa|Associação Nacional de Doentes Linfáticos vai organizar, em colaboração com a ESDRM|Escola Superior de Desporto de Rio Maior, mais uma Caminhada Nórdica.

Esta atividade acontece no dia em que mundialmente se faz uma chamada de atenção para o linfedema e está aberta a todas as pessoas que queiram participar.

Se não tiver bastões a organização tem para facultar, sendo que o número é limitado.

Se veste a camisola esteja presente!

(ponto de encontro: Quinta das Conchas - junto ao café da entrada)

para mais informações contacte info@andlinfa.pt

Faça a sua inscrição aqui

Leia este post, que consideramos de interesse

      Imagem sem legendas

Para o reconhecimento do DIA MUNDIAL DO LINFEDEMA



dia mundial do linfedema
6 de março

Está a decorrer uma petição para  o reconhecimento do Dia Mundial do Linfedema. Lanço daqui o convite a cada um de vós, que sentir estar nesta causa, para subscrever esta petição.

No texto da petição pode ler-se, grosso modo, o seguinte:

Porque necessitamos de um dia do Linfedema:

É dada grande atenção à batalha contra o cancro. No entanto, a maioria das pessoas nunca ouviu falar de linfedema, que pode surgir no seguimento do cancro. Ouvimos falar pouco de crianças que nascem com má formações linfáticas ou aqueles que herdam linfedema. Há um silêncio sobre a questão dos veteranos feridos de guerra, vítimas civis e outras pessoas que sofrem de linfedema devido a trauma físico ou como resultado de intervenções cirúrgicas. Muitos sofrem sozinhos. Também muitos médicos permanecem sem formação sobre esta doença e que subestimam o impacto devastador que  esta doença tem sobre a qualidade de vida de uma pessoa. Muitos permanecem  sem o cuidado terapêutico necessário. E esta tragédia é agravada quando o governo e seguradoras privadas de saúde negam a cobertura pacientes, mesmo quando há tratamentos universalmente aceites para esta doença.

A Organização Mundial de Saúde estima que mais de 150 milhões de pessoas no mundo têm linfedema secundário, enquanto o National Institutes of Health (NIH) afirma que a incidência de linfedema primário poderá ser tão alta quanto 1 em 300 nascidos vivos. 

Dos 1,4 bilhões de pessoas em 73 países ameaçados por filaríase linfática, também conhecida como elefantíase, 120 milhões estão atualmente infectadas e 40 milhões destes pacientes estão desfigurados e incapacitados pela doença. 

Os Centros para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) adverte que a incidência de linfedema secundário entre sobreviventes de câncer está entre 20-40%. 
Estima-se que há 10 milhões de pessoas com linfedema nos Estados Unidos, de acordo com a Universidade de Stanford. Isto representa mais americanos do que aqueles que sofrem de SIDA, doença de Parkinson, distrofia muscular, esclerose múltipla e ALS-esclerose lateral amiotrófica. Por último referimos que, o processo contínuo de doenças afectadas pelo sistema linfático inclui doenças cardíacas, SIDA, diabetes, artrite reumatóide e a metástase de cancros.

Pode-se ainda ler, no texto da petição...

A mensagem  é clara:

"Linfedema e doenças linfáticas estão preste a assumir o seu lugar como prioridades internacionais."

Os dias de sermos invisível acabaram

Juntos, nós anunciamos Dia Mundial do linfedema que será celebrado em 06 de março. 


Vamos mostrar que todos os países ao redor do globo apoia esta causa. LE & RN e seus membros internacionais estão convidando os pacientes, seus familiares e amigos, advogados, políticos e profissionais de tratamento de todos os países para fazer ouvir as suas vozes ao assinar a petição para reconhecer o Dia Mundial Linfedema.


Tratamento do Linfedema também no Centro de Saúde de Beja


Sou Fisioterapeuta no Centro de Saúde de Beja e trabalho no apoio ás senhoras portadoras de edema linfático secundário a mastectomia desde 1996 quando fiz, juntamente com as colegas do IPO, o 1º Curso de Drenagem Linfática Manual que o Prof Leduc veio dar em Lisboa. Na altura eu já estava em Beja e já  apoiava estas utentes da região Alentejo enviadas pelo colegas do IPO ou pelo Prof Mário Bernardo com o principal objectivo de restabelecer as amplitudes articulares e corrigir atitudes viciosas,
aliviar na dor e fazer o ensino de atitudes do dia a dia a adoptar para  evitar o aparecimento  do linfedema.  O curso foi uma mais valia no sentido de tornar mais eficaz a diminuição e controlo do linfedema. No inicio fiz este trabalho no Centro  Fisioterapia São João Baptista onde já trabalhava em regime pós laboral e só mais tarde iniciei este trabalho também a nível do Centro de Saúde. São já alguns anos de experiência no apoio a estas utentes com resultados muito positivos que se reflectem não só  no carinho que me dispensam como na confiança que demonstram quando me procuram constante e periodicamente ou porque houve um agravamento, porque  precisam de uma nova manga, ou simplesmente porque querem ser reavaliadas e repetir o tratamento, porque efectivamente assim deve ser feito.

Há contudo uma questão que muito me preocupa e que talvez agora a Associação Nacional dos Doentes Linfáticos possa dar uma ajuda no sentido de encontrar uma solução para que o apoio a estas senhoras continue da melhor maneira. É que estas utentes são isentas de taxas moderadoras durante 5 anos. Mas terminado este prazo e após  nova ida à Junta de Incapacidade é-lhes retirada a isenção. Lamento muito porque
o linfedema é uma sequela com a qual têm de viver para sempre e que não podem descurar para que ele se mantenha controlado. O tratamento é demorado, complexo e caro!! Mesmo no Centro de Saúde!!!...

E para algumas senhoras não é possível suportar mais esta despesa...

texto e fotos de:
Laura Xavier
Fisioterapeuta no Centro de Saúde de Beja